sábado, 30 de maio de 2015

Roberto Romano sobre a pretensa reforma política, O Globo 29/05/205

‘Esta reforma [política] é estratégia de despiste. Não é séria’

Em um seminário esta semana, ouvi a seguinte análise de um jurista: ‘Cobram a fidelidade do político ao partido, mas não a fidelidade do próprio partido’
Roberto Romano,O Globo

“Esta reforma política é uma estratégia de despiste. Uma estratégia para não se resolverem os problemas essenciais do Estado e da representação: o Parlamento trata de questões da reforma para a sociedade não o cobrar mais.

Para citar a frase muito conhecida de Lampedusa, ‘é preciso mudar para que tudo continue o mesmo’. Não é uma reforma séria. O Parlamento brasileiro não tem a qualidade do Estado moderno de ser institucionalizado.

A atitude do presidente da Câmara de desconstituir a comissão da reforma, por exemplo; por mais defeitos que o relatório da comissão tivesse, era um instrumento institucional. Mas, na tradição brasileira personalista pré-democrática, ele usou os poderes de presidente, de forma imperial.

Além disso, para que esta fosse uma reforma política crível, precisaria ter começado por tratar da legitimidade dos partidos. O que a Câmara fez hoje (ontem), ao manter as coligações para eleições proporcionais e ao aprovar cláusula de barreira não tão rigorosa para o acesso a Fundo Partidário e tempo de TV, mostra como políticos são autopreservadores, e como tiram os programas partidários da vista do eleitor.

No caso do acesso ao Fundo e ao tempo de TV, desde que o STF proibiu a cláusula de barreira, a anarquia se estabeleceu nessa área. Se você não tem critério juridicamente seguro para que só partidos com estofo político obtenham esses recursos, isso dificulta decisões sobre a questão.

Em um seminário esta semana, ouvi a seguinte análise de um jurista: ‘Cobram a fidelidade do político ao partido, mas não a fidelidade do próprio partido’. Não se questiona a fidelidade ao programa, o que legitima um partido. O problema é que a base da legitimidade democrática é a legitimidade partidária”. (Alessandra Duarte)

Roberto Romano, professor de Filosofia Política e Ética da Unicamp

Sessão para análise e discussão da Reforma Política (Foto: Gustavo Lima / Câmara dos Deputados)Sessão para análise e discussão da Reforma Política (Foto: Gustavo Lima / Câmara dos Deputados)