segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Uol eleições


Dinastias Fruet e Richa reeditam comando da Prefeitura de Curitiba e do governo após 30 anos

Carlos Kaspchak
Do UOL, em Curitiba

Com a eleição de Gustavo Fruet (PDT) nesse domingo (28), em Curitiba, o Paraná terá as mesmas dinastias políticas no comando do governo do Estado e da Prefeitura da capital após 30 anos.
O atual governador, Beto Richa (PSDB), é filho do ex-governador José Richa, que conquistou o Palácio Iguaçu em 1982, pelo PMDB, na primeira eleição direta para o cargo em quase 20 anos. Conforme as regras da época, coube a ele indicar o prefeito da capital. E Richa escolheu seu colega de partido Maurício Fruet, pai de Gustavo.

Imagens da corrida eleitoral em Curitiba

Foto 76 de 76 - 28.out.2012 - Após vencer segundo turno, Gustavo Fruet (esquerda) comemora em carreata nas ruas de Curitiba, no Paraná. Com apoio do PT, o advogado e ex-deputado federal reverteu o resultado do primeiro turno e superou o empresário e deputado federal Ratinho Junior (PSC) Mais Heuler Andrey/UOL
Passados 30 anos, os dois levam os sobrenomes de volta aos postos em que seus pais os colocaram. A diferença é que Beto Richa e Gustavo Fruet estão em lados opostos no cenário político paranaense após estas eleições municipais.
Ambos eram aliados até recentemente, mas estão rompidos desde que Richa não endossou o projeto de Fruet de concorrer à Prefeitura de Curitiba pelo PSDB. Com o desgaste que o episódio gerou a ele dentro da sigla, Fruet deixou a legenda e ingressou no PDT.
Vencedor do embate pela Prefeitura de Curitiba, Fruet saiu vencedor --enquanto Richa não conseguiu ver seu apadrinhado e ex-vice-prefeito (2004-2010)  Luciano Ducci (PSB) se reeleger. Ele ficou a uma distância de 4.402 votos de Fruet, na primeira etapa da campanha, e amargou uma terceira colocação.


Oligarquias políticas

Consultados pelo UOL, tanto o professor de Ética e Filosofia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Roberto Romano, quanto o professor-adjunto de Ciência Política da UFPR (Universidade Federal do Paraná), Adriano Codato, avaliam que Beto Richa e Gustavo Fruet atuam dentro da lógica das oligarquias políticas locais, um fenômeno que, afirmam, não é exclusivo da política paranaense.
“É perfeitamente previsível. O Brasil é dominado pelas oligarquias regionais”, disse Romano. “A missão delas é tentar gerir o Estado com seus herdeiros, e os partidos não são mais do que braços dessas famílias. O que acontece no Paraná está dentro desta regra.”
Para Codato, o saldo mais negativo é para o governador tucano. “Não acho que [o resultado das eleições] seja exatamente um conflito de dinastias políticas, mas a situação traz mais desconforto para o governador do que para o prefeito, maior vitorioso neste processo”, argumentou.
Conforme o analista, sociedades com estruturas democráticas recentes, como é o caso do Brasil, tendem a ter classes políticas alinhadas em poucos grupos, que se sucedem no poder. “Não é de estranhar que em algum momento estes grupos políticos se rivalizem”, afirma Codato. “Uma hora ou outra as dinastias se confrontam.”
Romano avaliou que Richa perdeu nesta eleição, e agora vê seu projeto político futuro ameaçado. “Ele tem se mostrado um político tradicional, como os antigos oligarcas. Perder a eleição em Curitiba compromete suas ambições locais e nacionais”, analisa.
“Ele perde adesão no seu próprio Estado e poder para pretensões maiores dentro do seu partido”, observou Romano. “O poder das oligarquias é um retrocesso violento e relação à democracia e ao estado de direito", analisou.

Pais de Gustavo e Beto eram aliados políticos

José Richa começou sua carreira política em Londrina (379km ao norte de Curitiba), onde foi eleito vereador, deputado federal e prefeito. Em 1978, elegeu-se senador pelo MDB. Gustavo Fruet é filho do ex-prefeito de Curitiba (1982-1985) Maurício Fruet, que também foi deputado estadual e federal pelo Paraná.
Aliados e companheiros de partido, primeiro no MDB e depois no PMDB, José Richa e Maurício Fruet foram lideranças políticas importantes nos anos 1970 e 80. Foram aliados até que Richa deixou o PMDB para ser um dos fundadores do PSDB, em 1988.
Maurício Fruet morreu em 1998 quando era candidato a deputado federal,  a 35 dias das eleições. Gustavo Fruet assumiu a candidatura e foi o deputado federal mais votado naquele pleito.
José Richa morreu em 2003, quando Beto Richa era vice-prefeito de Curitiba na gestão de Cássio Taniguchi (DEM). Os dois herdeiros sempre fazem referências aos pais. Na eleição de 2010 para o governo, um dos bordões de campanha de Richa era “aprendi a fazer política com o meu pai”. Fruet sempre usou a mesma fórmula nas campanhas para deputado, depois ao Senado e agora para prefeito.

Modelo desgastado

“Temos, no Paraná, chefes políticos com perfil autoritário e até despótico, como é o caso do ex-governador e senador Roberto Requião (PMDB), que acreditam que a votação que têm pode ser repassada aos seus herdeiros. Mas não é isso que acontece. Eles não conseguem eleger seus sucessores, como ocorreu agora com Beto Richa”, disse Codato.
Codato avaliou que esses chefes políticos, que classifica como “mandões de partidos”, não conseguem mandar no eleitor. “E esta eleição, em Curitiba, é um testemunho disto”, avaliou. Apesar disso, ele relativizou a derrota eleitoral de Richa. “Não está tudo acabado. O seu grupo político não vai entrar em crise, ainda que perder o poder em Curitiba fortaleça o PT no Paraná e preocupe o projeto de reeleição do governador”, comentou.
Para Codato, o relacionamento político entre ambos vai depender das ações de Gustavo Fruet. “Ele tem dois desafios. O primeiro é permanecer num partido que praticamente não existe e que ele ajudou a crescer, pois já deixou o PMDB e o PSDB. Depois, decidir como será a relação com o PT, pois ele tem cacife político para mudar o rumo do processo eleitoral em 2014. Pode ser aliado da ministra Gleisi Hoffmann (Casa Civil) ou até mesmo ser o candidato a governador.”
Para Beto Richa, diz o estudioso, a situação é mais complicada. “Há um certo constrangimento, e a situação será desconfortável por causa da vitória do desafeto", observa. “Mesmo assim a aparência será de cordialidade. É o que o jogo político vai exigir dos dois”, completou.

Ratinho Júnior, a surpresa

Codato classificou o deputado federal Ratinho Junior (PSC) como um “fenômeno”. Apesar de derrotado no segundo turno por Fruet, o político sai fortalecido das urnas e assustou as dinastias políticas locais, acredita.

“Ele ganhou mais visibilidade, se consolidou como líder político. Ele e o pai (o apresentador Ratinho, do SBT) saem vencedores. E ele não vem de uma dinastia política. Ao contrário, está mais ligado aos negócios do pai, que, como empresário das comunicações, precisa de um representante político forte para defender seus interesses.”