sábado, 21 de abril de 2012


Sexta-feira, 20 de Abril de 2012

Com exames assim não vamos longe

No teste intermédio de filosofia do Ministério da Educação português, que se pode ler aqui, encontrei os seguintes erros:

  1. No item 1.2 do Grupo II o aluno tem quatro escolhas para completar a frase "Num argumento, denominam-se premissas...". Acontece que nenhuma das alternativas dada aos alunos está correcta. A alternativa que os autores da prova pensam que está correcta é a C: "...as proposições que justificam a conclusão". Isto está errado porque num argumento inválido as suas premissas não justificam a conclusão - apenas pretendem justificá-las, mas fracassam nesse desígnio.
  2. No item 1.3 do mesmo grupo há duas alternativas igualmente correctas: a C e a D. Na verdade, seria mais correcto dizer que ambas são igualmente incorrectas. Quando um argumento é válido, as suas premissas sustentam a sua conclusão (esta é a alternativa C) - apesar de ser verdade que fazem mais do que isso; mas se fazem mais do que isso, fazem também isso. Já a alternativa D, que é a que os autores da prova têm em mente, está correcta, mas tem falta de precisão: pois "deriva necessariamente" é um pleonasmo - quando uma proposição deriva de outra ou outras, deriva necessariamente, pois a relação de derivação entre premissas e conclusão é algo que ocorre apenas quando não há qualquer circunstância em que as primeiras sejam verdadeiras e a última falsa.
Pior do que os erros de pormenor, contudo, é o facto de a prova não avaliar qualquer competência filosófica última; apenas avalia competências filosóficas instrumentais. A compreensão dos conceitos e ideias dos filósofos é meramente instrumental para aprender a raciocinar filosoficamente. Avaliar apenas essa compreensão, mas não aquilo que constitui a sua finalidade seria como avaliar, no futebol, não a competência para jogar jogos de futebol, mas antes exercícios de flexões e corrida, que certamente fazem parte do treino dos futebolistas, mas não constituem a finalidade deste.
Para se fazer tolices destas, ainda por cima a nível nacional, mais vale acabar com os exames nacionais e deixar os filhos de cada qual entregue às arbitrariedades dos seus professores e escolas - desse modo, pelo menos alguns terão a sorte de ter professores competentes, que irão prepará-los com carinho e rigor para o que é crucial em filosofia, ao passo que com exames nacionais deste cariz todos são vítimas da incompetência educativa nacional costumeira. Ou será que estou a ver mal?