quinta-feira, 16 de junho de 2011

De um leitor, que me enviou o texto do Joint Committee on Quantitative Assessment of Research Citation Statistics, segue o e mail abaixo.

Caro professor Roberto Romano,

Muito interessante o post sobre o novo Qualis. Esses métodos para
medir a qualidade da producão científica são sempre mal utilizados,
tanto que eu acredito ser melhor simplesmente acabar com eles.
Aproveito para mandar como anexo um artigo publicado pela IMU
(International Mathematics Union) em 2008 acerca dos indicadores de
produtividade (índice de impacto, citacões, etc...). Um grupo de
matemáticos e estatísticos analisou esses índices e como são usados, e
chegou a conclusão de que eles não correspondem à realidade, além de
serem utilizados de forma incorreta a maioria das vezes. (E ninguém
poderá acusar os matemáticos e estatísticos da IMU, alguns dos
melhores do mundo, de ignorantes em... matemática e estatística!)

Um aspecto da discussão que me parece nunca ser abordado é o seguinte:
para quê publicar em periódicos? Hoje em dia, as editoras de revistas
científicas não prestam mais grande servico técnico à comunidade, já
que gracas aos computadores e à internet os autores fazem a maior
parte do trabalho de edicão e tipografia, e também divulgacão (pelo
menos é assim em Matemática e Computacão). A conclusão a que eu
cheguei é que publicamos em periódicos para obter prestígio entre os
pares (no caso de publicacões em periódicos realmente prestigiosos,
que não necessariamente são bem avaliados) ou apenas para que possamos
ser bem avaliados por órgãos como a CAPES (no Brasil e fora do Brasil)
e assim poder obter mais verbas para bolsas, viagens, etc.

Isso já levanta uma importante questão. O senhor defende, e eu
concordo, que os revisores de projetos da CAPES, etc., não sejam
anônimos, pois determinam a alocacão de dinheiro público. Mas todos
nós, quando agimos como revisores de artigos submetidos a periódicos,
estamos indiretamente colaborando para o sistema de avaliacão que
depois será utilizado por agências finaciadoras para determinar a
alocacão de recursos públicos. Não seria então também mais correto que
os revisores de periódicos também não fossem anônimos? Afinal, se eu e
meus amigos consistentemente rejeitamos artigos de determinado
pesquisador ou grupo, tal pesquisador dificilmente obterá recursos
junto a CAPES, etc.

Outro fenômeno que vejo ocorrer no Brasil e também fora do Brasil é a
perda da importância da tese de doutoramento, principalmente em áreas
de ciências exatas e biológicas (não tenho como julgar a área de
humanidades). Antigamente (e ainda bem que foi esse o meu caso), para
que o candidato pudesse defender, bastava que escrevesse uma boa tese,
com pesquisa original, etc. A tese era o documento que dava acesso à
defesa e ao título, ela era importante em si. Hoje em dia, muitos
grupos de pesquisa colocam a (descabida) exigência de que o aluno
publique um certo número de artigos em bons periódicos para que possa
defender. Às vezes a exigência é explícita, às vezes apenas implícita,
mas ela existe. O senhor bem deve saber que a maioria dos alunos de
doutorado perdem noites de sono pensando a respeito de suas
publicacões... A pressão para publicar é imensa!

Transfere-se assim o trabalho de revisão que deveria ser feito pela
banca para revisores anônomos das revistas em questão. Hoje em dia as
bancas raramente lêem muito da tese que é submetida e confiam no
carimbo de qualidade dos periódicos. E como resultado cada vez menos
importância é dada à revisão da tese pelos alunos, muitos deles chegam
a simplesmente colar seus artigos todos juntos e escrever uma
introducão para o conjunto.

Bem, já me alonguei demais, mas esse é um assunto de imensa
importância. Infelizmente, sou pessimista e não vejo saída para a
atual situacão. E tenho que continuar publicando em periódicos, e
defendendo esses periódicos dos que acham que não são, assim, tão
bons!

Cordialmente,