quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Seminário Jornal do Commercio (Rio), em 23/julho/2009.

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O leitor releve o "estilo" dos textos abaixos. Eles transcrevem falas não revistas pelos autores. Mas tais alocuções ajudam, imagino, a entender o cipoal chamado Brasil, sobretudo a sua triste situação corrupta e dilemas fiscais. A fala do Dr. Maciel é muito interessante, pois mostra mecanismos insuspeitados pelos que pagam impostos no país. RR

Agradeço o convite feito pelo Jornal do Commercio. Espero estar à altura. Também agradeço a possibilidade de estar com pessoas que definiram não apenas a história econômica mas a história do Brasil nos últimos anos. Com o convite, pensei em apresentar duas faces da Ética: a primeira abordada com brilho pelo Dr. Ernane e a segunda seria aqui no Brasil. Nos caso da Ética é sempre aquele lamento, citado pelo Dr. Ernane, pelo fato de que lemos a doutrina da Ética, na Grécia, é com o olhar que é do bem, do correto. Uma das considerações mais importante, encontrada em Platão e Sócrates, é que Ética que pode ser lida como postura. A palavra hexis vem deste termo, postura. Da sociedade guerreira em que se é importante a postura - seja ela de sentar, nadar, etc. Um dos essenciais da guerra grega era o atacante sair de sua cidade e chegar à do inimigo e destruir os meios vitais, videiras e oliveiras. Arrancavam estas árvores e voltavam para defender as suas. A rapidez era elemento importante e também a postura. Logo a Ética pode ser certa ou errada sem deixar de ser Ética. Temos este costume, esta atitude que transmitida ou deixada ao arbítrio pode caminhar para o mal ou para o bem. Essa diferenciação è importante porquê temos o modelo da boa Ética e esquecemos que a outra opera, quase automaticamente, e esta muita vezes é mais forte que a outra aprendida na sociedade. É importante para definir a Ética. Uma vez assumida uma postura errônea ela tende a se perpetuar. No trânsito, por exemplo. Se você disser a um motorista que avança o sinal que ele é um criminoso, provavelmente a pessoa irá se assustar. O perigo da Ética vem daí, você faz o bem automaticamente e o mal também. Os grandes filósofos Maquiavel, Montaigne voltaram-se para o hábito para mostrar o quanto ele é perigoso. O problema do viver a Ética no estado brasileiro. Nós surgimos no século XVI quando se consolida a instauração do estado absoluto, quando havia a questão do imposto. Junto com isso o monopólio da força física e da norma jurídica, o chamado três monopólios do Estado Moderno. No Brasil, quando surgimos em Portugal encontramos o estado absoluto andando. Nunca tivemos no Brasil uma realidade européia, muito bem descrita por Alexis de Tocqueville (1805 1859), que é a existência de municípios autônomos do ponto inclusive do vista dos impostos. O município é uma invenção romana. Não existia município na Grécia. Era uma cidade autônoma que se tornava aliada a Roma mas mantinha suas prerrogativas sobre religiosidade, eleição e taxação. Essa questão fez com que os municípios tivessem uma situação privilegiada em relação às terras dominadas por nobres (donde a idéia que o ar da cidade torna livre). Era um elemento importante para o campesinato, no período do feudalismo, fugir do senhor feudal, da nobreza que escorchava nas taxas, na injustiça. Os nossos municípios já surgiram dentro do controle dos 3 monopólios. Ao contrario da França, do século XVII, tivemos municípios já subjugados e sem poderem aplicar ali os impostos recolhidos, que iam direto para Portugal. O retorno do dinheiro era extremamente problemático. A professora Maria Sylvia Carvalho Franco tem um livro chamado "Homens livres na ordem escravocrata" e mostra que na região de São Paulo, no começo do século XIX, havia cidades que estavam há cem anos sem cemitérios, sem escolas, sem nada. O que acontecia, diz ela, os vereadores, fazendeiros, os homens bons emprestavam ao município. Tiravam do bolso para fazer a infra-estrutura, emprestavam a mão de obra que era escrava e davam o material para a construção. Com isso estas pessoas surgiram com pessoas boas que favores à população. Em pouco tempo o raciocínio inverso se deu: quando o município precisa, eu empresto; quando eu preciso, o município deve me emprestar. Donde esta zona cinzenta entre o público e o privado. Ela cita um caso de um tesoureiro de município que jogava com a arrecadação certo mês e devolvia no mês seguinte. E disse: "o errado não é emprestar, é não pagar". A questão é que o emprestado era do município. Esta situação é freqüente até hoje dada esta máquina de puxar impostos para o poder central. A dificuldade do retorno faz com que prefeitos fiquem quase sempre, nolente volente, presas de esquemas para puxar dinheiro para a região. Agora os bons não são os que emprestam dinheiros e sim os deputados, vereadores que conseguem na boca do caixa recursos para a região. Os contribuintes não se perguntam como aquele dinheiro está chegando. Um deputado somente ético não será reeleito nunca, se for eleito. Esta é a complexa máquina de um país continental, com municípios sem receita própria. Neste caso temos a concorrência. Não por acaso as licitações são a caixa preta da administração municipal e todo escândalo tem uma passagem muito forte pelos municípios . A Controladoria Geral da União (CGU) procura ser imparcial, sorteia o município, mas o que é a CGU diante da complexa maquina tributária tanto de administração como de distribuição? Esta seqüência dialética faz com que o político comece a pensar que está fazendo bem ao município e que não fará o mal se pegar uma parte para se reeleger. Nos então temos uma ameaça direta à questão da concorrência e à transparência. Não é por acaso a imprensa tem sido vítima de ataques fortíssimos. Há dois anos atrás um procurador chegou a defender a quebra do sigilo jornalístico para o combate da corrupção. De um lado este Ética hedionda que não vê o limite do público e do privado que autoriza a comoção da população. Em muitas regiões você ouve: não gosto daquele político mas sem ele não haveria verba federal para o meu estado. Este sistema é uma rede de valores. Em vez de ser a sociedade da competência, da concorrência, é uma sociedade de favores. Muitos empresários são levados a fazer favores para conseguir seus intentos. Elemento que diminui sua capacidade competitiva do ponto de vista científico tecnológico. Quando a licitação é ganha através de meios não transparentes nós temos este descanso no atraso. É preciso quando pesamos em Ética, verificar seu lado sombrio. O que o jurista Norberto Bobbio chama de armadilhas do anti-estado. O estado paralelo que muitas vezes tem mais competência que o estado de fato. Por outro lado esta Ética que herdamos, a do favor, impede justamente a existência de um mercado segundo pressupostos básicos da concorrência. Por último, mas não menos importante, que a imprensa tenha aberto os olhos do contribuinte para estas realidades mas também espicaçando os agente econômicos e políticos para trazer à tona a realidade descrita também pelo Dr. Ernane Galvêas que nos coloca atrás de países piores que o nosso. Muito obrigado.

Dr. Everardo Antunes Maciel. Consultor Tributário da Logos Fiscal É tarefa difícil falar sobre tributação e mais ainda suceder as exposições do ministro Ernane Galvêas e do professor Roberto Romano. Vou abordar diretamente o tema falando sobre sistema tributário e concorrência. Não sem falar dos três conflitos subjacentes entre fisco e contribuinte. O primeiro: entre o dever fundamental de pagar imposto e a percepção do imposto como forma de rejeição social. O dever fundamental de pagar impostos, explorado pelo tributarista contemporâneo português Casalta Nabais, está assentado no princípio da solidariedade, da necessidade de contribuir para produzir uma sociedade civilizada mas se contrapõe ao princípio da liberdade. Pagar impostos é sustentado na teoria do mal necessário, por ele se chega ao bem-estar comum a todos. Daí podemos estruturar a sociedade e gerar benefícios a todos os cidadãos. O segundo conflito é de natureza conceitual, entre eficiência e justiça. De um lado se pretende que estes sistemas tributários tenham um fundamento de justiça, daí surgiram princípios fundamentais, como o da progressividade. Aquele de tributar a renda desproporcionalmente ao aumento da própria renda, de tomar a capacidade contributiva como conceito que informa a construção dos sistemas tributários contrastando com o princípio da eficiência. Por exemplo: dois apartamentos em um mesmo edifício, um destruído e outro excepcional. Se alguém vai tomar o valor venal de ambos, evidente que o de melhor condição terá o valor venal maior. O valor venal é que informa o tributo, o IPTU. Mas ambos pagam o mesmo valor. Segundo o princípio da justiça o de maior valor venal deveria pagar mais em relação àquele que está destruído. No entanto, o custo para fazer esta distinção é maior do que para fazer a diferenciação de arrecadação. Em nome da eficiência, o IPTU é igual. O custo marginal para distinguir é maior que para fazer a diferenciação. Isto deu origem ao princípio consagrado na tributação moderna, o da praticabilidade. Hoje ombreado com os princípios clássicos como o da capacidade contributiva. É importante que os sistemas essencialmente funcionem. Senão funcionam temos então um paradoxo, eles se tornam injustos. O terceiro conflito é entre o estado de bem-estar social e o estado liberal. É uma opção de natureza política e não tributária. Temos no Brasil uma carga tributária que fica pouco acima a 37%, superior à de países como o Japão, por exemplo. Mas inferior à média de países da Europa. O que explica distinção? A opção política! No Japão temos uma opção liberal enquanto na Europa temos uma opção pelo bem-estar social, o estado provedor do serviço. A opção política faz a distinção. Eu costumo dizer que o que faz carga tributária não são os impostos, são os gastos. Se eles continuam a crescer não há como ignorar o superávit primário. As pessoas que defende aumento de gastos são as mesmas que reclamam do aumento de carga tributária. Ante a qualquer ineficiência nos setores públicos do Brasil afirma-se que são necessários mais impostos. Dado determinado nível de gastos se diz que poderá haver um aumento de juros, logo aquele que mais gasta é aquele que mais recebe. O projeto é encaminhado ao congresso para abrir espaço para a votação e dizem: as receitas estão subestimadas. Como chegam aos gastos? Diante do imperfeito modelo de federalismo fiscal brasileiro para estabelecer transferências voluntárias da União aos municípios através de emendas parlamentares. O que é uma excrescência do ponto de vista fiscal. Ou se tem consciência de que a carga tributária vem com o aumento dos gastos ou o problema nunca será sanado. É a regra do jogo que tem de ser mudada. Estes atos ainda que respaldados legalmente, ao meu ver, são da natureza da sonegação, são atitudes oportunistas". Lembra aquele ditado espanhol: "hecha la ley, hecha la trampa". Assim que surge uma lei, surge a forma de burlá-la. Klaus Tipke, um dos maiores tributaristas do século XX, escreveu o livro "A moral tributária do Estado e do contribuinte", certamente sua obra mais reconhecida e qualificada na questão da moral tributária na qual divide o pagador de impostos em tipologias morais: Hommo economicus: aquele que avalia os risco e as vantagens da evasão fiscal. Se o risco é alto eu não faço. Segundo, o insensato: aquele que busca compensar deficiência no sistema público com evasão fiscal ao questionar porque pagar impostos se o serviço não está funcionando. O outro é o mal-humorado: discorda do governo e crê correto privar o governo de recursos, visão simetricamente paternalista. O liberal considera o imposto como uma invasão do Estado. Já o legalista explora ao máximo as lacunas e defeitos da leis em benefício próprio, o que provoca a evasão fiscal. Esta é a origem do planejador fiscal, que vai buscar as brechas fiscais sem infringir a lei para pagar menos impostos. O sexto, o inexperiente, é incapaz de interpretar a lei e transfere sua responsabilidade para terceiros. Por último temos o sensível à justiça, sempre escandalizado com os valores a serem pagos. Tipke aponta este tipos em reação ao fisco. A primeira atitude reativa é a evasão fiscal, quando se deixa de pagar impostos de forma ilegal. Seja culposa, o inadimplente; ou dolosa, o sonegador. A segunda é o planejamento tributário, do tipo legalista, ele busca brechas legais para defender os interesses de sua empresa para pagar menos ou não pagar impostos. Questão muito debatida, pois o que está sendo feito não contraria a lei mas fere o princípio da igualdade. Quando alguém vai pagar o imposto de renda como pessoa física nós oferecemos a seguinte informação: o que vocês está fazendo está tecnicamente correto, mas se escolher o modo simplificado pagará menos impostos, e oferecemos o simplificado. Esta foi a decisão que eu tomei para socializar o instrumento e mostrar que não precisa contratar um especialista no tema, o programa do fisco fará isto. Lembro-me de certa vez em que um jornalista me ligou e disse: "estou perplexo! Entrou um vírus no meu computador ou não? Qual é a armadilha ou chegamos no primeiro mundo?" Como forma de me parabenizar pelo feito. No Brasil a elisão fiscal é praticada e não é ilegal, mas o Código Tributário Nacional estabelece que a administração poderá desconsiderar atos praticados com a exclusiva finalidade de evitar ou postergar o pagamento de impostos. Se uma empresa faz uma cisão legal, porém se ela teve a finalidade da cisão para fazer adiar ou postergar impostos, o fisco dirá seu ato é legal mas não terá efeitos para fins tributários, sem vantagens. Essa norma foi condicionada aos procedimentos especiais, neste aspecto concedemos uma eficácia limitada. Esta norma só existe no mundo jurídico quando os procedimentos foram criados. Nós tentamos criar estes procedimentos na forma de emenda fiscal mas o congresso não aprovou. Registro que o fisco tem atuado como forma de eficácia plena mas a norma subjacente definiu seus limites mas não que seja condição imprescindível. Diria que é matéria de fronteira e na minha avaliação ela não existe. Um planejamento que ofende a igualdade. No Brasil a questão virou mercadoria. Há escritórios de advocacia que ligam para contribuintes perguntando se precisam de ajuda para pagar menos impostos. Em nenhum país do mundo tem tanta matéria tributária na constituição como o nosso. Aqui se abre espaço para antecipar sob tutela através de liminares que compromete a concorrência. Primeiro pela existência no Brasil do controle de constitucionalidade difuso. Não existe o controle centralizado. Então é possível o juiz de primeira instância dizer que esta norma é inconstitucional. E suspende a eficácia da norma - pelo menos incidentalmente. É para um contribuinte, não para os contribuintes. Porque as decisões que envolvem eficácia suspensão só pode ser tomada pelo Supremo. Nenhum país no mundo tem tanta matéria tributária na Constituição como o Brasil. E todas são questionáveis. Os que tem algo levemente parecido são as constituições do Japão e Alemanha, outorgadas logo após a II Guerra Mundial., de contenção e não de expansão de direito. A existência de uma elevada densidade tributária na Constituição dá espaço para assuntos de natureza técnica como substituição tributária, de não cumulatividade. Não é um conceito facilmente esclarecido. Depois de 40 anos há um debate se tributo pode incidir sobre tributo em votação no congresso, isto é desde a Constituição de 1946. Não é possível imaginar o que eu já vi nesta matéria sobre lucro operacional e lucro operacional bruto. A teoria de interpretação pode isto. Se esta matéria requer um percurso muito grande pela sua natureza é natural e inevitável que demore. Alguém poderia dizer que estou beneficiando o contribuinte. Nada de mais, exceto pelo pecado de afetar a concorrência. E algumas empresas gozam deste privilégio. Porque o Supremo, numa decisão posterior, disse que é constitucional. É constitucional ou inconstitucional? Uma discussão que privilegia aquela empresa a despeito de outra. Mas ofende o princípio da igualdade. Aponto para estes desvios como a matriz de desequilíbrio da concorrência do ponto de vista tributário.A primeira atitude reativa é a informalidade. Aqui no Brasil criamos dois tipos: o trabalhador de primeira classe ou o de quinta classe. Se tem direito a tudo que resume e do outro lado a empresa ou o contribuinte que resume tudo à informalidade. Boa parte da força de trabalho, 48 milhões de pessoas, estão na informalidade. Vamos flexibilizar o parâmetro de direito, exemplo: o percentual de FGTS está tirando o direito do contribuinte. Mas não está tirando daquele que não paga. A atitude reativa da sociedade é continuar a informalidade. Outro item é a falta de proteção ao consumidor, falando de pirataria. Tive oportunidade de ouvir discussões sobre pirataria que nos põe a pensar no assunto. Conheci um pouco da China e é conhecida fama dos produtos orientais, dentre os quais os chineses. Certa vez recebi a visita do embaixador da China para tratar de apoio para a Organização Mundial de Aduanas. Ele perguntou se poderia fumar e eu lhe ofereci um cigarro pirateado na China como forma de dizer que não poderia apoiá-lo. Por que os chineses praticam tanto a pirataria? A compreensão é complexa. Na China admite-se de dualismo existencial, a formalidade e a informalidade. "One country, two sistems". Os chineses são guiados por paradigmas: Confúcio, a ordem; e Tao, a liberdade. Na China pirataria não é vista como crime e sim como uma homenagem ao autor. A terceira questão diz respeito aos danos causados à cidadania fiscal. Atitudes que fazem com que haja um desinteresse do cidadão em relação ao equilíbrio fiscal. A quarta é em relação à concorrência desleal causada pela evasão fiscal ou pelo planejamento previdenciário abusivo. A Constituição, na mudança efetivada pela emenda número 42/ 2003, trouxe o conceito de desvios tributários constitucionais: lei complementar poderá estabelecer critérios especiais de tributação para prevenir desequilíbrios da concorrência sem causar prejuízo. Reconhecem que regra tributária pode produzir desequilíbrio da concorrência. Se esta norma alcançar as demais entidades federativas será feita a exigência de lei complementar. Essas regras podem causar danos. Quais são as principais ferramentas para a enfrentar os desvios concorrenciais? Em lugar de cobrar o tributo de um, cobrarei de outro. O Brasil foi o segundo país do mundo a inserir o Imposto sobre Valor Agregado. Agregado a quê? Ao consumo, à renda? Muitos pensam que o Brasil não tem IVA, mas tem e com sérios problemas. O erro foi conferir competência estadual para ele. Depois foi cobrar até o varejo, porque é difícil cobrar o IVA numa sociedade pouco estruturada como a nossa, aí criou-se o imposto da substituição tributária. Este regido pela praticabilidade. A outra é a incidência monofásica e detém a sonegação na frente. Outra, alíquotas ad rem, sobre a unidade física. Qual a explicação? Para prevenir processos onde o preço é importante e para prevenir a sonegação. Para concluir: falta a disciplina da utilização de liminares e a antecipação de tutela em matéria tributária. A segunda é a reestruturação do processo administrativo fiscal. Quando fui secretário da Fazenda nos anos 1970 era absolutamente vergonhoso era o contribuinte ser inscrito em dívida ativa. Quando fui secretário da fazenda nos anos 1990 contribuintes diziam para mim que gostaria de discutir o tema na justiça.Fiquei espantado ao perceber que discutir na justiça era inscrever na dívida ativa porque esta não é mais cobrada. A capacidade de recuperação no processo de dívida ativa é de 1%. No Brasil, temos hoje, só na área federal R$ 600 bilhões inscritos na dívida ativa e a possibilidade de recuperação deste valor é mínima. A terceira questão é a eliminação da guerra fiscal, cuja lei é extremamente severa, lei complementar de 24 de janeiro de 1975. Tem alguns erros, porém consertáveis. Deveria ser dito que é proibido fazer guerra fiscal no Brasil. Chega ao ponto de dizer que o governador cujo governo recebeu de forma irregular incentivos fiscais estabelece a fruição de irregularidade do Tribunal de Contas da União. Ninguém quer acabar com a guerra fiscal no Brasil. Até o Judiciário faz vista grossa. Eu entendo a guerra fiscal é a concessão de benefícios de forma ilegal para compensar desvantagens de natureza econômica. As remissões e anistias fazem com que o consumidor diga que não vai pagar. São um risco moral que deveriam ter objetivos mais bem definidos sobre quem poderia recebê-las. Sabendo das condições objetivas, pode-se dar uma remissão. Outro campo é o da transação. Instrumento legítimo e poucas vezes utilizado em leis esparsas, apesar de previsto no código nacional. A dimensão de um litígio é maior que o problema. Tem de ser visto sob a visão de transação. Se quero evitar que empresas morram, tenho de chegar a um ponto em que se diga que as duas empresas transigem. Mas os domínios são complexos. Por último, o projeto de reforma tributária. Me perguntam sobre a reforma e eu pergunto: qual reforma? Não é termo auto-explicativo não. Tem a reforma para o bem e para o mal. Aqui cultuamos o conceito de reformas mas precisamos definir o que se quer. Tem o candidato que diz: eu sou pela mudança, pela reforma. Mas que reforma? Para quê? Lembro daquela passagem de "Alice no país das maravilhas" que ao encontrar uma encruzilhada Alice pergunta qual caminho tomar. O gato responde: para aonde você quer ir? "Não sei", diz Alice; e o gato responde: então tanto faz! Essa resposta nos posiciona diante das reformas. Quando me pergunta se determinada reforma vai à frente eu digo "tomara que não". Pois se está ruim é só esperar piorar. A criação do imposto sobre bens e serviços. O que é uma operação com bens? Não sei. Pode ser sobre pessoa física, jurídica, movimentação financeira, ... É como usar uma ogiva nuclear para matar mosquito. Pode-se subscrever numa lei complementar, num papel em branco que poderá mudar o que ainda não se sabe o que é. Uma coisa indeterminada é uma coisa indeterminada. Aí vem o perigo. Acaba com todos os institutos destinados a prevenir os desvios constitucionais. Isto é uma ameaça. Encerro dizendo que matéria tributária é complexa, não é simples aqui ou em qualquer país de primeiro mundo. Sistemas tributários são a expressão das circunstâncias históricas, políticas, sociais e culturais de um país. Concluo com um velho provérbio inglês: "Todo problema complexo tem uma solução simples e errada."