quinta-feira, 15 de abril de 2010

Rerum Natura...

"Ai esta terra ainda vai cumprir seu ideal, ainda vai tornar-se um imenso Portugal...".

E a profecia foi cumprida, mas desde 1500, quando cá aportaram os bravos guerreiros da Inquisição, que proibiram imprensa, máquinas, inventos... A profecia é desnecessária hoje, no Brasil Apedeuta: os bravos militantes seguem a trilha dos cruzados. Ela é mais do que realidade miserável. Os militantes também negam a ciência, a técnica e são iliteratos. Boa leitura (para os que sabem ler...). RR







15/04/2010 | 11:01 login
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VASCO GRAÇA MOURA

Um país de analfabetos

por VASCO GRAÇA MOURAOntem36 comentários

Acabo de receber um estudo recente, elaborado pela Data Angel, e intitulado A dimensão económica da literacia em Portugal: uma análise.

Esse estudo, traduzido para português e com abundantes quadros relativos aos tópicos abordados, trata aspectos que vão desde a economia da literacia até ao papel das competências da literacia na economia, passando pela reunião de indicadores sobre os seus resultados a nível individual, pelos dados sobre os seus efeitos macroeconómicos, por uma comparação entre os resultados do ensino e a qualidade dos recursos humanos em Portugal e pelo papel das competências na literacia.

É muito interessante ver que as conclusões do estudo, de resto sinteticamente antecipadas no seu prefácio, confirmam absolutamente tudo aquilo que várias vozes críticas, incluindo a minha própria, têm vindo a dizer ao longo das últimas décadas sobre os níveis de cultura e de literacia dos portugueses...

Definindo a literacia como "a capacidade de compreender e de aplicar conhecimento apresentado em forma impressa" (talvez fosse preferível falar em forma "escrita") e partindo do princípio da relevância essencial de um bom nível de literacia para o desenvolvimento económico e o progresso, a igualdade de oportunidades e a justiça social, aí podemos ler que "os adultos com baixas competências de literacia passam mais frequentemente por episódios de desemprego, recebem salários mais baixos, apresentam muito maiores probabilidades de serem pobres, têm uma saúde mais débil, socialmente são menos empenhados e têm um acesso menos frequente a oportunidades educativas (...)". Tudo isto já era sabido e tenderá a agravar-se e muito numa situação de economia global, se não for atalhado convenientemente .

Segundo as conclusões do documento, Portugal encontra-se "entre os países da Europa que apresenta [sic] menos avanços no que respeita ao aumento da oferta e da qualidade da educação pré-escolar, do ensino básico, do ensino secundário e do ensino superior". Em consequência, "os níveis de literacia encontram-se entre os mais reduzidos da área da OCDE e Portugal tem as percentagens mais elevadas de adultos com baixas competências de todos os países europeus".

Por outro lado, "o nível de exigência, em termos de literacia, do mercado de trabalho português, está entre as mais baixas [sic] da Europa", embora a situação esteja a melhorar lentamente. "O mercado de trabalho português apenas recompensa as competências de literacia nos níveis mais elevados" o que não estimula ninguém a melhorar a sua formação.

Deveriam portanto associar-se "políticas educativas, sociais e económicas" (note-se a omissão de referências expressas a políticas culturais...) e, nesta perspectiva, afirma-se que, a não se proceder dessa maneira, "as indústrias portuguesas vão ter cada vez mais dificuldades em competir com os seus concorrentes europeus e de outros países estrangeiros".

Considera-se o Plano Nacional de Leitura "desesperadamente necessário em Portugal", embora se torne necessário introduzir-lhe uma série de correcções e melhoramentos, quer no tocante à competência pedagógica dos professores, quer no que respeita ao incentivo de uma procura crescente da leitura e à quantidade de horas que deverão ser-lhe dedicadas no pré-escolar e nos primeiros anos de escolaridade. E observa-se ainda que o mercado de trabalho português é pouco exigente e pouco compensador em matéria de competências da literacia, o que, aliado ao fraco aumento da procura social dessas competências e da participação dos discentes em práticas de literacia, deixa pairar dúvidas quanto ao impacto desejado das medidas.

Para alem destes pontos, que aqui sintetizo imperfeitamente, o estudo sugere um reforço de meios das políticas de literacia, sob pena de diminuir a eficácia do Plano Nacional de Leitura e de ser ainda mais negro o cenário que nos espera.

Este estudo é supérfluo, na medida em que vem confirmar o que tanta gente tem andado a dizer e hoje toda a gente sabe. E isso resume-se assim, descontadas as fórmulas edulcorantes: Portugal é um país de analfabetos cujas políticas de educação têm falhado cronicamente.

É também um país em que a cultura e a língua materna se degradam de um modo estarrecedor e em que o Ministério da Educação tem de rever com a maior urgência e plena autoridade os programas que a tais matérias dizem respeito.


2 comments:

Leonardo disse...

Nossa! Este trecho poderia facilmente estar a falar do Brasil, aqui acontece o mesmo. E costumo dizer que nosso Ministério da Educação tem sido uma dos maiores impecilhos para o desenvolvimento da (boa) educação. Estamos mal, cá e lá.

Rui Baptista disse...

O interesse que me despertou este artigo fez com que ontem ´nele pusesse este comentário:

"A acutilante, e tragicamente verdadeira, frase de Vasco da Graça Moura -'Portugal é um país de analfabetos '-, merece ser complementada pela adjectivação do falecido Francisco de Sousa Tavares: 'Analfabetos diplomados'.

Diplomados a nível básico, secundário e, até, superior na loucura de mediocratizar (em vez de democratizar) o ensino nacional"