terça-feira, 30 de março de 2010

Sobre o bullyng e o cyberbullyng, algumas questões ético-escolares.

Recebo com frequência perguntas de pessoas que acompanham minha participação na vida educacional. Uma delas, diante de um caso concreto, me apresentou as seguintes perguntas. Depois, seguem as minhas tentativas de resposta. Publico os dois conjuntos porque sei que eles podem interessar os que se colocam em lado contrário à corrosão do caráter que impera em nossas sociedades. RR


1. Deve a escola permanecer alheia ao que se escreve em redes sociais - MSN, ORKUT, Formsprings, Facebook,....ou não ?

2. De que forma deve a escola interceder na questão - orientação aos pais, alunos com reuniões, comunicados,...?
3. A escola é parte integrante desta rede ética externa ou não ?

Se um jovem é vítima do "cyberbullyng" e a escola alega que não pode controlar a situação, o que pensar?

1) Creio ser falta de compromisso ético de qualquer escola, mesmo a universitária, dizer que "nada pode ser feito por ela" em caso de molestamento direto, por carta comum ou internet. A escola, como a família, é sujeito de direitos e deveres. E se jovens são postos sob sua responsabilidade, esta não se limita ao âmbito da sala de aula, da biblioteca ou da cantina. Evidentemente, do ponto de vista legal, os diretores escolares podem alegar que nada está previsto, neste âmbito, no que tange a eles. Mas quem disse que uma escola é apenas uma repartição legalmente orientada? Ela é uma instituição moral e éticamente responsável pelo jovem que deve formar, justamente, para o convívio civil. Se um professor ou dirigente de escola abre mão desse múnus, então, a quem iríam os pais recorrer? A polícia, a promotoria de justiça, são instituições relevantes, mas quando as coisas chegaram a um ponto de não diálogo e não retorno (quando as vítimas e seus genitores entrarem no domínio da punição exemplar dos crimes e contravenções) de maneira nenhuma a escola deve permanecer alheia ao que se passa com seus estudantes. A vigilância precisa ser permanente, sobretudo quando existem denúncias ou suspeitas de perseguição. Se forem criados turnos de vigilância (do qual podem participar todos os integrantes da comunidade escolar responsáveis, maiores, como docentes, pais, funcionarios) o molestamento pode ser detido no começo. E se for levado ao exame prudente as tentativas, na presença de todos os pais, os que deveriam cuidar melhor de seus pimpolhos em casa estarão postos, antes que ocorra um processo judicial mais gra ve, diante de seu dever.

Esta última é uma sugestão para a segunda pergunta.

Quanto à terceira: a escola não apenas integra, mas com a família ela é um motor essencial da formação ética e moral dos jovens e, diria mesmo, dos pais que não tiveram a referida formação ou, devido aos atropelos da vida, não a empregam no trato com seus filhos. Tenho, neste particular, um conceito de autoridade e disciplina que vai contra os preceitos da "educação complacente", ao modo de Summerhill e dos que seguiram aquela diretriz. É muito c�?modo, no meu entender, fugir dos inevitáveis choques quando os jovens exigem algo e a prudência desaconselha. O conflito, se assumido com maturidade pelos adultos (ou supostos adultos...) ajuda a aproximação e a busca comum de soluções. Se adiado infindavelmente, ocorre apenas que os jovens, com autoridade que não lhes cabe, decidem tudo e dão cabeçadas (prejudicando a si mesmos e aos outros). Bom co nselho de Platão, seguido por Rousseau: se o bebê chora à noite, os pais devem verificar tudo neles, ouvidos, barriga, perninhas, etc. E atendê-lo se necessário. Mas devem ligar o sinal amarelo: se no dia seguinte houver choro novamente, e nada prejudicial à saúde ocorreu, não atendam, porque é o grito do tirano que se manifesta pela primeira vez. Existem pais que levam tapas de filhos, deles recebem ordens, críticas, caçoadas. Isto gera comportamentos éticos detestáveis, mas infelizmente "populares". fonte das "mean girls" (e boys), não raro, é a covardia dos pais no instante em que devem mostrar auto-respeito. (...) Da perseguição à passagem de drogas, e outras coisas mais, tudo pode ocorrer num recreio, na saída da escola, nas baladas permitidas como se fossem obrigatórias as permissões paternas.

Enfim: se a escola finge ignorar que seus estudantes perseguem ou são perseguidos em pontos sensíveis da alma humana (beleza corporal, inteligência, sexualidade, relações de amizade, etc) ela abre mão de sua essência, ou seja, a de levar o caráter dos estudantes ao pleno desabrochamento positivo, respeitoso de sua própria pessoa e da que encontram nos outros. O cyberbullyng é uma forma de comportamento de massa. E todas as massas agem de maneira irrefletida, covarde, cruel, se não encontram obstáculos. Cabe à escola —é o meu sentimento— com a família, determinar tais obstáculos éticos e morais, e nã o apenas legais, contra a imersão dos jovens na massa de perseguição.

O livro de Elias Canetti, Massa e Poder (São Paulo - Companhia das Letras), ajuda a entender o comportamento cruel dos grupos, em especial quando ele analisa as massas de fuga e de perseguição. Entendendo tal comportamento, é menos difícil encontrar meios de impedir que os jovens operem como reunião de lobos e não como individualidades responsáveis.

Roberto Romano